Obediência, o que é?
Obediência vem do latim obediscere, submeter-se à vontade de outrem e executá-la. É a acção de realizar a ordem dada por um superior, equivalendo a aquiescência, tácita ou expressa, face a um determinado comando.
A ideia foi particularmente acentuada pelo paternalismo e pelo absolutismo, gerando o modelo do hábito de obediência dos súbditos face a uma entidade superior, o soberano.
Outra é a perspectiva da obediência pelo consentimento, onde aquele que obedece apenas o faz relativamente à quilo a que dá consentimento, pelo que, de certa maneira, obedece a si mesmo, assumindo-se, ao mesmo tempo, como súbdito e soberano, isto é, como cidadão. É esta a perspectiva do consensualismo. Do mesmo modo se procura a autoridade, aquele quid que procura a obediência espontânea.
O normal numa comunidade política é a obediência espontânea exigida pela sociabilidade, pelo sentimento comunitário, pelo interesse individual de obedecer e só depois pela coacção, tanto a psicológica, como a virtual ou em potência, dita coercibilidade, ou coacção potencial
Logo, a coacção pode ser entendida como uma afirmação da liberdade. Porque, como refere Jacques Maritain, a autoridade deve ser obedecida em consciência, isto é, da maneira como os homens livres obedecem e no interesse do bem comum. O animal apenas tem obstáculos naturais, não tem liberdade e não sente a coacção. E esta, como ensina Castanheira Neves, não é mais que aquele instrumento de que as colectividades organizadas se servem para impor ao arbítrio a vinculação jurídica válida... a coacção defende a liberdade contra o arbítrio, mas a coacção só será válida se for o instrumento da aplicação de um direito válido e um direito válido é aquele que recebe o seu fundamento e encontra o seu limite na consciência ética, será esta também o fundamento e o limite da coacção aceitável.
Quem manda, manda, sobretudo, pelo reconhecimento daqueles que estão sujeitos ao mando. Porque todo o poder tende a ser um ofício, um simples poder-dever. Penetra-se assim na zona da autoridade, onde a obediência pelo consentimento é bem diferente da obediência pelo temor.
Utilizando palavras de Georges Burdeau, a autoridade é assim a qualificação para dar uma ordem, distinta do simples poder que é apenas a possibilidade de ser obedecido. Já não se trata de um dominium servile, produto do pecado, mas antes de um dominium politicum, que já exige legitimidade.
Como diz Rousseau, ainda o mais poderoso de todos os homens não será suficientemente poderoso, se não souber converter o seu poder em direito e a obediência dos outros em dever. Porque a força é uma potência física, de cujas actuações não pode resultar nenhuma moral.
Também Schiller refere que a única coisa que torna poderoso aquele que manda é a obediência daquele que obedece.
Contudo, saliente-se que, na perspectiva do absolutismo, é a obediência que faz o imperante (oboedientia facit imperantem). O soberano é absoluto porque não está limitado a não ser pela sua própria vontade. Não está limitado pelo direito, porque é ele que cria o direito e nem sequer está dependente das próprias leis que edita.
Porque aquilo que o principe quer, aquilo que o principe diz, tem valor de lei, o direito deixa de ser fundamento e limite do soberano. Também a soberania é vista como um circuito directo de comando, sendo determinada pela adesão ou submissão de um povo relativamente ao seu governo. Por outras palavras, a qualidade soberana, afinal, nasce de um hábito de obediência de uma determinada sociedade face a um superior.
Mas já Espinosa observava que a obediência não se refere tanto à acção externa quanto à acção anímica interna. Donde resulta que quem está mais submetido a outro, é quem decide com toda a sua alma obedecer- lhe em todos os seus preceitos; assim, quem tem a máxima autoridade, é quem reina sobre os corações dos súbditos.
Para Weber, se o poder enquanto Macht é a mera possibilidade de alguém impor a sua vontade a outrem, mesmo contra a vontade dele, já a segunda forma de poder, Herrschaft, implica a probabilidade de se encontrar obediência, que haja a presença efectiva de alguém mandando eficazmente em outros. Se no Macht o comando não é necessariamente legítimo, nem a submissão é obrigatóriamente um dever, já no Herrschaft, a obediência fundamenta-se no reconhecimento, pelos que obedecem, das ordens que lhe são dadas, isto é, tem de haver consentimento.
Por seu lado, Alain salientava que o cerne da política estava na relação entre a resistência e a obediência: o cidadão pela obediência assegura a ordem; pela resitência assegura a liberdade, dois termos que não seriam opostos, mas sim correlativos, porque não há liberdade sem ordem e a ordem de nada vale sem liberdade, pelo que haveria que obedecer resistindo, porque um homem livre contra um tirano, tal é a célula da política, isto é, obedecer em corpo; jamais obedecer em espírito; ceder absolutamente e, ao mesmo tempo, resistir absolutamente.
A ideia foi particularmente acentuada pelo paternalismo e pelo absolutismo, gerando o modelo do hábito de obediência dos súbditos face a uma entidade superior, o soberano.
Outra é a perspectiva da obediência pelo consentimento, onde aquele que obedece apenas o faz relativamente à quilo a que dá consentimento, pelo que, de certa maneira, obedece a si mesmo, assumindo-se, ao mesmo tempo, como súbdito e soberano, isto é, como cidadão. É esta a perspectiva do consensualismo. Do mesmo modo se procura a autoridade, aquele quid que procura a obediência espontânea.
O normal numa comunidade política é a obediência espontânea exigida pela sociabilidade, pelo sentimento comunitário, pelo interesse individual de obedecer e só depois pela coacção, tanto a psicológica, como a virtual ou em potência, dita coercibilidade, ou coacção potencial
Logo, a coacção pode ser entendida como uma afirmação da liberdade. Porque, como refere Jacques Maritain, a autoridade deve ser obedecida em consciência, isto é, da maneira como os homens livres obedecem e no interesse do bem comum. O animal apenas tem obstáculos naturais, não tem liberdade e não sente a coacção. E esta, como ensina Castanheira Neves, não é mais que aquele instrumento de que as colectividades organizadas se servem para impor ao arbítrio a vinculação jurídica válida... a coacção defende a liberdade contra o arbítrio, mas a coacção só será válida se for o instrumento da aplicação de um direito válido e um direito válido é aquele que recebe o seu fundamento e encontra o seu limite na consciência ética, será esta também o fundamento e o limite da coacção aceitável.
Quem manda, manda, sobretudo, pelo reconhecimento daqueles que estão sujeitos ao mando. Porque todo o poder tende a ser um ofício, um simples poder-dever. Penetra-se assim na zona da autoridade, onde a obediência pelo consentimento é bem diferente da obediência pelo temor.
Utilizando palavras de Georges Burdeau, a autoridade é assim a qualificação para dar uma ordem, distinta do simples poder que é apenas a possibilidade de ser obedecido. Já não se trata de um dominium servile, produto do pecado, mas antes de um dominium politicum, que já exige legitimidade.
Como diz Rousseau, ainda o mais poderoso de todos os homens não será suficientemente poderoso, se não souber converter o seu poder em direito e a obediência dos outros em dever. Porque a força é uma potência física, de cujas actuações não pode resultar nenhuma moral.
Também Schiller refere que a única coisa que torna poderoso aquele que manda é a obediência daquele que obedece.
Contudo, saliente-se que, na perspectiva do absolutismo, é a obediência que faz o imperante (oboedientia facit imperantem). O soberano é absoluto porque não está limitado a não ser pela sua própria vontade. Não está limitado pelo direito, porque é ele que cria o direito e nem sequer está dependente das próprias leis que edita.
Porque aquilo que o principe quer, aquilo que o principe diz, tem valor de lei, o direito deixa de ser fundamento e limite do soberano. Também a soberania é vista como um circuito directo de comando, sendo determinada pela adesão ou submissão de um povo relativamente ao seu governo. Por outras palavras, a qualidade soberana, afinal, nasce de um hábito de obediência de uma determinada sociedade face a um superior.
Mas já Espinosa observava que a obediência não se refere tanto à acção externa quanto à acção anímica interna. Donde resulta que quem está mais submetido a outro, é quem decide com toda a sua alma obedecer- lhe em todos os seus preceitos; assim, quem tem a máxima autoridade, é quem reina sobre os corações dos súbditos.
Para Weber, se o poder enquanto Macht é a mera possibilidade de alguém impor a sua vontade a outrem, mesmo contra a vontade dele, já a segunda forma de poder, Herrschaft, implica a probabilidade de se encontrar obediência, que haja a presença efectiva de alguém mandando eficazmente em outros. Se no Macht o comando não é necessariamente legítimo, nem a submissão é obrigatóriamente um dever, já no Herrschaft, a obediência fundamenta-se no reconhecimento, pelos que obedecem, das ordens que lhe são dadas, isto é, tem de haver consentimento.
Por seu lado, Alain salientava que o cerne da política estava na relação entre a resistência e a obediência: o cidadão pela obediência assegura a ordem; pela resitência assegura a liberdade, dois termos que não seriam opostos, mas sim correlativos, porque não há liberdade sem ordem e a ordem de nada vale sem liberdade, pelo que haveria que obedecer resistindo, porque um homem livre contra um tirano, tal é a célula da política, isto é, obedecer em corpo; jamais obedecer em espírito; ceder absolutamente e, ao mesmo tempo, resistir absolutamente.
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